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Há alguns meses, um amigo e seguidor do Jossa Blog, Eustáquio José da Silva, , organizador do blog (A)cultura Social: Perspectivando!, fez-me uma solicitação. Disse ele que, apesar de eu estar sempre apresentando muito material interessante e desconhecido pela maioria, ainda não havia colocado nada sobre o seu estilo musical preferido: o blues. De fato, foi um detalhe que me passou despercebido. Eu já indiquei Mallavoodo, que apresenta elementos do estilo, mas nada sobre o ritmo propriamente dito.
Admito que, na verdade, esta minha falha se deve quase que totalmente a minha ignorância sobre os artistas de tal ritmo no Brasil. Ao saber deste detalhe, aquele que me fez a solicitação, ansioso para ver uma postagem sobre o assunto, indicou-me dois grandes artistas do blues nacional: Flávio Guimarães (gaitista carioca, membro da banda Blues Etílicos) e Nuno Mindelis (guitarrista angolano, radicado há muitos anos no Brasil). Assim, atendendo ao pedido, decidi disponibilizar algo sobre o primeiro, mas não sem primeiro fazer uma pequena provocação, que também servirá de justificativa para minha escolha.
A minha pergunta é: o que faz do blues um bom estilo musical? Em geral, seus arranjos não são complexos e o ritmo costuma ser bastante repetitivo. Além disso, trata-se de um estilo bastante fechado. É raro conseguir uma fusão do blues com outro estilo musical. Lembro-me apenas de fusões com o rock and roll, como fizeram o Lynyrd Skynyrd, Led Zeppelin e outras bandas similares. Também fui informado recentemente de fusões com o soul. Todavia, além desses ritmos não me consta nenhum outro, ao contrário do jazz, que já foi misturado com samba, frevo, rock e vários outros estilos. Enfim, tais qualidades, ao meu ver, parecem contribuir para a caracterização de um estilo pobre, ruim, com pouca coisa a se admirar.
Contudo, não é isso que ocorre com o blues. Por quê? Bem... Eu poderia deixar esta questão sem resposta, para que outros tentassem uma resposta. Mas, como admirador do ritmo em questão, tentarei expôr o que o torna digno de prestígio para mim.
Primeiramente, apesar de contar com composições e arranjos simples, isso não significa que estes são ruins. Em geral, os blues man trabalham bastante as canções, a fim de não deixar falhas. Neste ponto, também é interessante observar que, assim como o jazz, o estilo em questão apresenta espaço para o improviso, permitindo fugas das repetições.
Em segundo lugar, podemos argumentar que, a respeito da "inflexibilidade" do ritmo, talvez não se tenha tentado o suficiente. As possibilidades ainda estão abertas e muita surpresa pode surgir nos próximos anos, décadas, séculos, sabe-se-lá-quando...
Por fim, em terceiro lugar, o blues é um ritmo que possui história; é impossível compreender sua grandeza e importância sem tal conhecimento. Muitos elementos deste ritmo ainda são mantidos na contemporaneidade devido a suas importâncias históricas, como a melancolia das música e a gaita como um de seus instrumentos mais característicos. A propósito, alguém saberia dizer a razão desta última? Pois é... Uma vez que o blues foi um estilo inventado pelos negros escravos americanos e estes, por sua própria condição social, possuíam poucos recursos financeiros (muitas vezes, nenhum), tinham de contar com os instrumentos mais baratos possíveis para elaborar suas composições. E, qual o instrumento mais barato que se tinha naquele período? Exatamente! A gaita, ou harmônica.
E quanto à melancolia? O seguinte texto de Mayara Galvan, presente no blog acima indicado, responde: "As chamadas work songs eram realizadas pelos escravos [das regiões próximas ao rio Mississipi] no pouco tempo disponível. Suas letras cantavam sentimentos de dor e angústia causado pelo excesso do trabalho. Sem nenhum instrumento musical, já que não lhes era permitido seu uso, improvisavam com ferramentes de trabalho para dar ritmo às canções. Pouco a pouco um estilo único vinha emergindo, carregado de emoção e daquilo que pode ser visto no próprio nome, o 'Blues'".
Em suma, foram estas duas características, a gaita e a melancolia, que me fizeram escolher por Little blues, de Flávio Guimarães. Ambas encontram-se bastante presentes na obra deste músico. (De qualquer modo, sem dúvidas, também indico Nuno Mindelis. Excelente guitarrista! Já tocou, inclusive, com Steve Ray Vaughan!).
Flávio Guimarães iniciou sua carreira musical em meados dos anos 80, ao fundar o grupo Blues Etílicos, uma das primeiras bandas de blues do Brasil. Apesar de sua participação na banda, sempre realizou trabalhos solos. Acompanhou grandes nomes da música nacional, como Alceu Valença, Luiz Melodia e Zeca Baleiro, e internacional, como Buddy Guy e Charles Musselwhite; também já chegou a abrir shows para B. B. King! Little blues corresponde ao seu primeiro álbum solo. Lançado em 1995, o disco conta com a participação de grandes admiradores do blues do Brasil e do mundo, como Ed Motta, Roberto Frejat, Paulo Moura e Sugar Blue.
Apesar de ser predominantemente blues, o álbum também apresenta influências do jazz e do rock em algumas músicas, como se observa em 'Na Baixa do Sapateiro' e 'Sick and tired' respectivamente. Além destas duas faixas, também destaco: 'Hand jive', 'Hoochie coochie man' e a jam 'Baby, please don't go', com participação de Roberto Frejat e muitos outros. Todavia, acima de todas, recomendo 'Honest I do', com Ed Motta nos vocais. Muito bom!
Para finalizar, dedico esta postagem àquele que tanto me cobrou e esperou por tal ocasião: Eustáquio José da Silva. Também recomendo fortemente o seu blog (cujo link encontra-se no início da postagem): muitos textos e notícias interessantes por lá. Verifiquem!
Coincidentemente, acabo de lembrar um detalhe: ontem foi aniversário de outro grande amigo, já citado e homenageado anteriormente (duas vezes). Contudo, uma vez que tal obra envolve seu instrumento preferido, a gaita, também dedico tal postagem (mais uma vez) a Kleber Kyrillos, El Greco.
É isso... Fica aqui mais uma indicação. Apreciem sem moderação e até breve!
...Admito que, na verdade, esta minha falha se deve quase que totalmente a minha ignorância sobre os artistas de tal ritmo no Brasil. Ao saber deste detalhe, aquele que me fez a solicitação, ansioso para ver uma postagem sobre o assunto, indicou-me dois grandes artistas do blues nacional: Flávio Guimarães (gaitista carioca, membro da banda Blues Etílicos) e Nuno Mindelis (guitarrista angolano, radicado há muitos anos no Brasil). Assim, atendendo ao pedido, decidi disponibilizar algo sobre o primeiro, mas não sem primeiro fazer uma pequena provocação, que também servirá de justificativa para minha escolha.
A minha pergunta é: o que faz do blues um bom estilo musical? Em geral, seus arranjos não são complexos e o ritmo costuma ser bastante repetitivo. Além disso, trata-se de um estilo bastante fechado. É raro conseguir uma fusão do blues com outro estilo musical. Lembro-me apenas de fusões com o rock and roll, como fizeram o Lynyrd Skynyrd, Led Zeppelin e outras bandas similares. Também fui informado recentemente de fusões com o soul. Todavia, além desses ritmos não me consta nenhum outro, ao contrário do jazz, que já foi misturado com samba, frevo, rock e vários outros estilos. Enfim, tais qualidades, ao meu ver, parecem contribuir para a caracterização de um estilo pobre, ruim, com pouca coisa a se admirar.
Contudo, não é isso que ocorre com o blues. Por quê? Bem... Eu poderia deixar esta questão sem resposta, para que outros tentassem uma resposta. Mas, como admirador do ritmo em questão, tentarei expôr o que o torna digno de prestígio para mim.
Primeiramente, apesar de contar com composições e arranjos simples, isso não significa que estes são ruins. Em geral, os blues man trabalham bastante as canções, a fim de não deixar falhas. Neste ponto, também é interessante observar que, assim como o jazz, o estilo em questão apresenta espaço para o improviso, permitindo fugas das repetições.
Em segundo lugar, podemos argumentar que, a respeito da "inflexibilidade" do ritmo, talvez não se tenha tentado o suficiente. As possibilidades ainda estão abertas e muita surpresa pode surgir nos próximos anos, décadas, séculos, sabe-se-lá-quando...
Por fim, em terceiro lugar, o blues é um ritmo que possui história; é impossível compreender sua grandeza e importância sem tal conhecimento. Muitos elementos deste ritmo ainda são mantidos na contemporaneidade devido a suas importâncias históricas, como a melancolia das música e a gaita como um de seus instrumentos mais característicos. A propósito, alguém saberia dizer a razão desta última? Pois é... Uma vez que o blues foi um estilo inventado pelos negros escravos americanos e estes, por sua própria condição social, possuíam poucos recursos financeiros (muitas vezes, nenhum), tinham de contar com os instrumentos mais baratos possíveis para elaborar suas composições. E, qual o instrumento mais barato que se tinha naquele período? Exatamente! A gaita, ou harmônica.
E quanto à melancolia? O seguinte texto de Mayara Galvan, presente no blog acima indicado, responde: "As chamadas work songs eram realizadas pelos escravos [das regiões próximas ao rio Mississipi] no pouco tempo disponível. Suas letras cantavam sentimentos de dor e angústia causado pelo excesso do trabalho. Sem nenhum instrumento musical, já que não lhes era permitido seu uso, improvisavam com ferramentes de trabalho para dar ritmo às canções. Pouco a pouco um estilo único vinha emergindo, carregado de emoção e daquilo que pode ser visto no próprio nome, o 'Blues'".
Em suma, foram estas duas características, a gaita e a melancolia, que me fizeram escolher por Little blues, de Flávio Guimarães. Ambas encontram-se bastante presentes na obra deste músico. (De qualquer modo, sem dúvidas, também indico Nuno Mindelis. Excelente guitarrista! Já tocou, inclusive, com Steve Ray Vaughan!).
Flávio Guimarães iniciou sua carreira musical em meados dos anos 80, ao fundar o grupo Blues Etílicos, uma das primeiras bandas de blues do Brasil. Apesar de sua participação na banda, sempre realizou trabalhos solos. Acompanhou grandes nomes da música nacional, como Alceu Valença, Luiz Melodia e Zeca Baleiro, e internacional, como Buddy Guy e Charles Musselwhite; também já chegou a abrir shows para B. B. King! Little blues corresponde ao seu primeiro álbum solo. Lançado em 1995, o disco conta com a participação de grandes admiradores do blues do Brasil e do mundo, como Ed Motta, Roberto Frejat, Paulo Moura e Sugar Blue.
Apesar de ser predominantemente blues, o álbum também apresenta influências do jazz e do rock em algumas músicas, como se observa em 'Na Baixa do Sapateiro' e 'Sick and tired' respectivamente. Além destas duas faixas, também destaco: 'Hand jive', 'Hoochie coochie man' e a jam 'Baby, please don't go', com participação de Roberto Frejat e muitos outros. Todavia, acima de todas, recomendo 'Honest I do', com Ed Motta nos vocais. Muito bom!
Para finalizar, dedico esta postagem àquele que tanto me cobrou e esperou por tal ocasião: Eustáquio José da Silva. Também recomendo fortemente o seu blog (cujo link encontra-se no início da postagem): muitos textos e notícias interessantes por lá. Verifiquem!
Coincidentemente, acabo de lembrar um detalhe: ontem foi aniversário de outro grande amigo, já citado e homenageado anteriormente (duas vezes). Contudo, uma vez que tal obra envolve seu instrumento preferido, a gaita, também dedico tal postagem (mais uma vez) a Kleber Kyrillos, El Greco.
É isso... Fica aqui mais uma indicação. Apreciem sem moderação e até breve!
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Ficha Técnica: Little blues (1995)
Mais informações: Flávio Guimarães
Primeiro eu agradeço ao caro amigo amigo Victor por atender ao meu pedido e postar algo de blues e agora digo sem medo de errar que além de boas coisas o blog está decididamente completo.
ResponderExcluirA meu ver o blues não é uma música ruim, além dos motivos citados pelo amigo que são convincentes e dos postados em meu blog pela minha querida parceira Mayara, posso dizer que no fato de o blues ter um arranjo simples e por vezes repetitivo este consegue fundir história + criação.
Em tempos de Skip James com seu violão e voz meio rouca e de Ray Vaughan ou Eric Clapton tivemos uma intensidade incrível. No caso da junção de blues com soul (exemplo do Luther Allison), blues com jazz (até neste próprio álbum postado percebe-se) o blues parece que mantém-se mesmo que em uniões musicais, é como se este fosse visto em músicas como as experimentações progressivas de Johnny Winter ou ainda nas inovações de bandas suecas que misturam blues e folk junto a metal.
De qualquer forma a simplicidade do blues é interessante porque para mim é o que demonstra a sua riqueza.
Pois é, Eustáquio. Concordo contigo! Teu comentário serviu de complemento para minhas observações.
ResponderExcluirTodavia, ao contrário do que me disseste pessoalmente, teu comentário tem uma provocação sutil, referente à completude do Jossa Blog. Todavia, também concordo nesse ponto. Apresentei diversos ritmos, mas faltava algo sobre o blues. Na verdade, ainda falta bastante; este blog ainda é uma criança. Ainda há muito assunto a ser discutido e muito artista brasileiro a ser apresentado. Mas, aos poucos, chegarei lá... Hehehe.
Grande abraço!
hehehe
ResponderExcluirNa verdade é um blog ao qual eu decididamente recorro quando o assunto é música tupiniquim.
Ainda digo que faltava algo desse tipo que privilegiasse não só a música produzida normalmente por aqui e midiática, mas que favorecesse conhecer coisas que jamais estão ao nosso alcance normalmente.
Sem medo de errar, coisa que já te disse pessoalmente, um dos melhores blogs que frequento!
Abraço!